Entre a ilegalidade e a incompetência

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Caros leitores do Blog do Jotacê, embora eu seja um antigo colaborador, já faz algum tempo que não participo do blog. Por esse motivo, me reapresento postando um texto que era para ter sido publicado logo antes do meu afastamento, ainda lá entre os idos de fevereiro e março, mas que, por um motivo ou por outro, acabou relegado a uma pasta qualquer do meu sistema operacional, aguardando a presente oportunidade. Acredito que nele está exposto um pouco da minha visão acerca de alguns aspectos que entendo relevantes no atual mercado de DVDs e Blu-rays.

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Pilha de DVDs apreendidos: pirata não é item de coleção.

Duas matérias publicadas sobre o Blu-ray – esta, muito boa, tendo ouvido os colecionadores, inclusive contando com a participação do nosso editor, “Jotacê”; e esta, que em certas partes mal consegue esconder sua torcida contra o formato – e mais alguns comentários de consumidores dos discos azuis e DVDs me inspiraram a escrever o texto que segue abaixo. Vejo-o como uma espécie de desabafo, um sincero e talvez um tanto trôpego relato de algumas frustrações sentidas por um autodeclarado colecionador dessas mídias.

Eu realmente acredito que parte significativa do mercado compra DVD pirata não porque não tenha dinheiro, mas em razão de uma cultura. Não são raras as vezes que estou numa livraria de shopping, por exemplo, e vejo alguém que claramente teria condições de comprar o produto original dizer algo assim: “ah, esse aqui a gente pega por cinco pila ali no centro…”.

Não se pode ignorar, contudo – e a constatação pode até parecer crueldade minha, embora eu prefira acreditar que é apenas realismo… –, que quem de fato só tem condições de comprar o pirata, está definitivamente fora do mercado formal do home video. Ressalvo: “definitivamente” ao menos até mudarem suas condições financeiras. Esse é um fato que todos que compõem o mercado, principalmente as distribuidoras, deveriam entender. Para essa faixa econômica do mercado, não há – e nem haverá – quem consiga concorrer com a pirataria. Em vez de tentar angariar esse tipo de consumidor, as distribuidoras deveriam estar mais preocupadas em não perder os que realmente tem condições de pagar mais por mais qualidade.

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Alguns DVDs originais parecem querer se juntar aos da foto acima.

Entendo, assim, que tentar aproximar o produto original do pirata é dar um tiro no pé. Eventualmente, reconheço, o projétil poderá demorar mais do que é capaz de tolerar a paciência dos consumidores mais conscientes até aleijar as majors, em virtude do gigantismo destas. Profilaticamente, no entanto, as distribuidoras fariam melhor se procurassem exaltar mais as qualidades do produto original. Para isso, entretanto, o original teria de ter qualidades verdadeiras, porque o consumidor, invariavelmente, em muitas particularidades, pode até ser ignorante, nunca é, todavia, ao menos não na intuição genérica que tem ou vai adquirindo acerca do produto, inveterada e irremediavelmente estúpido. Sendo assim, não basta dizer que “filme pirata tem imagem ruim”, quando muitos filmes originais também têm. Não basta dizer que filme pirata “estraga o tocador de DVD”, quando o caminho seguido pelos desenvolvedores desses aparelhos é justamente no sentido de diversificar os formatos que suportam etc.

Essa forma de abordagem é toda muito medíocre. Para mudar esse ciclo de nivelamento por baixo, as distribuidoras têm de fazer produtos realmente caprichados, e uma fatia importante dos consumidores, principalmente daqueles que têm poder aquisitivo suficiente, tem de deixar de se submeter à famigerada Lei de Gerson que, nesse caso, quando menos no médio e longo prazo, acaba sendo levar prejuízo em tudo – embora se contentem, conheço o raciocínio, em não ficar com uma balda de suposta “frescura” que lhes imputam os mais chegados, os quais costumam partilhar dessa cultura da mediocridade e, comezinho no Brasil, da informalidade e ilegalidade.

Como se vê, aí não vai nenhuma justificativa – tampouco apologia – à pirataria. Em vez disso, o que se propugna é que as distribuidoras parem de tentar aproximar seus produtos dos piratas. Ademais por ser essa uma medida perversa para o mercado em no mínimo dois sentidos: além de desqualificar o original – e eis aí o primeiro e mais visível –, a concorrência direta acaba conferindo uma aparência de legitimidade a um comércio que é inequivocamente imoral e expressamente ilegal, sendo, portanto, caso de polícia e não de “mercado democrático” como insinuam alguns que, por aí, abusam da novilíngua para flertar com a imoralidade e com a ilegalidade.

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